sábado, 28 de fevereiro de 2009

As Alterações Climáticas: uma realidade transformada em desafio

O aquecimento global refere-se ao aumento da temperatura média do ar à superfície da Terra. Este fenómeno é uma consequência do efeito de estufa, que tem vindo a ser intensificado pelas actividades Humanas, originando as alterações climáticas.
A atmosfera é a camada gasosa que envolve a Terra, constituída por vários gases, em que o azoto (N2) e o oxigénio (O2) existem em maior quantidade (99% no total). Os restantes gasesestão presentes em quantidades muito reduzidas, incluindo os conhecidos como gases com efeito de estufa (GEE). Estes GEE (vapor de água, dióxido de carbono - CO2; óxido nitroso - N2O e metano - CH4) absorvem parte da radiação infra-vermelha (IV), ou seja, o calor emitido pela superfície terrestre para a atmosfera, o que impede que ocorra uma excessiva perda de energia para o espaço. Por este motivo, o efeito de estufa (Fig. 1) é um mecanismo natural que ocorre na Atmosfera, possibilitando a manutenção da temperatura terrestre em valores óptimos para a vida no planeta. Na ausência deste mecanismo, o planeta teria uma temperatura média cerca de 33 ºC mais baixa que a actual, impossibilitando a vida como a conhecemos no nosso planeta e a água estaria em estado sólido em todo, ou grande parte dele. Como tal, a presença de GEE em reduzidas concentrações na atmosfera é essencial para um efeito de estufa equilibrado, ou seja, de modo a manter a temperatura da superfície da Terra.


fig.1 - O efeito de estufa (Fonte: Geographicae)

Desde a revolução industrial, em meados do século XVIII, que a quantidade de GEE emitida para a atmosfera tem aumentado, o que se agravou entre 1970 e 2004 (cerca de 70%). Este facto levou a um aumento da concentração destes gases na atmosfera e, por sua vez, ao incremento da absorção de raios IV, diminuindo a perda de calor para o espaço, o que contribui para o aumento da temperatura média global da Terra – o aquecimento global.
Segundo o 4º Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) [IPCC, 2007], nos últimos 100 anos o planeta aqueceu 0,74ºC, em média, sendo este aquecimento mais significativo no Hemisfério Norte (para o mesmo período, o aquecimento na Europa foi de 1ºC). O aumento da temperatura global tem causado outras alterações no clima, como a subida do nível do mar e a mudança dos padrões de precipitação, resultando em períodos de seca e de cheias, e outros eventos climáticos extremos, como os ciclones. Tais alterações climáticas provocam impactes na agricultura, nos recursos hídricos (caudal reduzido em rios durante o Verão, levando à escassez de água para consumo), erosão da costa, extinção de espécies e aumento de vectores de doenças [URL 1].
No entanto, vários estudos apontam para que o Homem não seja o único responsável pelas alterações climáticas, apesar de contribuir de forma significativa [IPCC, 2007]. Para as alterações climáticas contribui também a variabilidade climática. Este termo é usado na Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (UNFCCC) [UN, 1992] referindo-se às mudanças de causa natural. A variabilidade climática associada ao aquecimento global, ocorre em períodos de dezenas de milhares de anos, entre as idades do gelo, e é o resultado de quatro factores: natureza caótica do sistema climático, comportamento oscilante de agentes climáticos importantes, variabilidade da intensidade solar e aleatoriedade da actividade vulcânica [GCMarshall, 2005]. No entanto, quando usamos o termo “alteração climática” referimo-nos às mudanças causadas pelo Homem.
Os efeitos do aquecimento global são evidentes para além da já referida subida da temperatura. A nível mundial, entre 1961 e 2003, a subida do nível do mar foi de 18 cm por século, mas este valor aumenta para 31 cm por século se for considerado o período de 1993 a 2003 [IPCC, 2007]. As alterações climáticas não constituem apenas um problema dos países industrializados ou poluidores, mas é sim um problema global. Exemplo disso é o continente Africano, cujas emissões de GEE são desprezáveis face à quantidade emitida pelos países desenvolvidos, sendo no entanto das regiões do planeta mais afectadas pelos impactes do aquecimento global [IPCC, 2007]. As regiões da Europa mais vulneráveis às consequências do aquecimento global são as áreas montanhosas, o Árctico, as zonas costeiras e a região mediterrânica. A camada de gelo da Gronelândia está a diminuir e o nível do mar Árctico a aumentar. As regiões montanhosas (Alpes, Cárpatos, Montes Escandinavos, Pirinéus e Cáucaso) estão a perder a massa glaciar, o que se traduz num aumento do perigo de avalanches, erosão do solo e alto risco de extinção de espécies. Na região mediterrânica tem-se vindo a notar um decréscimo da precipitação anual e do leito dos rios, perda de solo agrícola, aumento dos fogos florestais, da área ardida e das ondas de calor. No entanto, na região do Noroeste Europeu tem ocorrido um aumento da precipitação durante o inverno com consequências ao nível do aumento do leito dos rios e maior risco de inundações costeiras [IPCC, 2007; EEA, 2008]. Todas estas alterações provocadas pelo aquecimento global têm implicações ao nível da qualidade da água superficial e subterrânea, na biodiversidade e ecossistemas territoriais, na qualidade dos solos para agricultura e na saúde humana. Importa ainda referir os impactes na economia devidos, por um lado, às perdas humanas e materiais associadas aos eventos climáticos extremos e diversos impactes das alterações climáticas, e por outro, aos investimentos necessários para implementar medidas mitigadoras (com o objectivo de reduzir as emissões de GEE) e de adaptação (que visam preparar os estados e regiões potencialmente mais afectadas para minimizar as consequências adversas das alterações climáticas).
O consenso entre os especialistas em alterações climáticas de que a temperatura global continuará a aumentar, tem levado organizações intergovernamentais, nações, estados, empresas e cidadãos a implementar acções para tentar reduzir o aquecimento global e a ajustar-se a ele. Neste sentido, à escala governamental e intergovernamental, surgiu o Protocolo de Quioto (1997), o Programa Europeu para as Alterações Climáticas (2000) e, no caso de Portugal, o Plano Nacional para as Alterações Climáticas (2001), entre outros, que consistem em documentos estratégicos com medidas de mitigação das emissões de GEE. Mais recentemente, em 2007, a Comissão Europeia adoptou o Livro Verde, onde se faz o diagnóstico dos impactes das alterações climáticas e está em curso o desenvolvimento do Livro Branco com estratégias de adaptação para os mesmos impactes. À escala empresarial, têm sido feitos esforços no sentido de aumentar a eficiência energética e uso de fontes alternativas de energia, bem como o comércio de emissões de GEE, no qual as empresas, em conjunto com os governos, limitam as suas emissões ou compram licenças àqueles que emitem menos que as suas quotas.
Este problema das alterações climáticas tem tido uma influnecia crescente na sociedade actual. De facto, a extensão, gravidade e os impactes resultantes das ditas catástrofes “naturais” estão intimamente associados às opções estratégicas de desenvolvimento e ao estilo de vida insustentável das sociedades modernas. O comportamento humano perante o ambiente e a insensibilidade das decisões de desenvolvimento tem levado a um incorrecto ordenamento do território e à alocação indevida de actividades humanas em zonas de risco. A análise do panorama mundial, em todo semelhante à situação nacional, mostra que a maioria da população (em Portugal cerca de 80%) vive em zonas costeiras, mais susceptíveis à ocorrência de desastres “naturais”, em que o aumento do nível do mar é o mais óbvio como se referiu. Mas também não se cuidam as áreas mais críticas em termos ambientais: os leitos de cheia dos rios, constrói-se sobre falhas sísmicas, desfloresta-se potenciando a desertificação...
Por outro lado, a alteração profunda dos usos do solo (o bem mais escasso que existe no Planeta...), designadamente o elevado índice de ocupação urbana e a respectiva pavimentação, na agricultura a mecanização e consequente compactação dos solos, têm contribuído para a diminuição da capacidade de infiltração e drenagem das águas.
Muito para além das negociações internacionais, existe um importante trabalho doméstico a realizar. Pôr em marcha a Agenda 21 Local (imaginem, foi aprovada na Conferência do Rio em 1992!!!) aparece como uma prioridade para a qualidade de vida das populações, através de opções inteligentes e ambientalmente correctas, que minimizem, quer a frequência, quer os efeitos das consequências das alterações climáticas.
E cabe a todos nós individualmente questionar os nossos padrões de vida para adoptar comportamentos sustentáveis, não apenas para o ambiente como também para a sobrevivência da Humanidade.
Existe uma longa lista de medidas mitigadoras e de adaptação que devem ser adoptadas por cada cidadão e que são tão importantes como as anteriormente apresentadas, como sejam a contenção e o uso racional de energia (optar por tecnologias mais eficientes, não desperdiçar energia – boas práticas energéticas); aproveitar a energia de fontes alternativas; preferir os transportes mais eficientes e mais limpos; reduzir, reutilizar e reciclar (3R) e mudar alguns hábitos que visem a minimização de desperdícios. A Terra é a única casa de que dispomos e é essencial preservar os recursos que ela nos pode oferecer. Esta é não apenas uma tarefa mas também um desígnio de todos e de cada um individualmente.
Sermos utilizadores conscientes e racionais dos recursos disponíveis é a chave, quer para o desenvolvimento sustentável, quer para a diminuição de GEE emitidos para a atmosfera, e é este o desafio que o aquecimento global nos deixa em mãos, a nós enquanto cidadãos. “Ninguém cometeu um erro maior do que aquele que nada fez porque era muito pouco aquilo que podia fazer” (E. Burke, Século XVIII).

Bibliografia
IPCC – Intergovernmental Panel on Climate Change (2007). Climate Change 2007: Synthesis Report. (Disponível em http://www.ipcc.ch/).

UN – United Nations (1992). United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC). (Disponível em: http://unfccc.int/resource/docs/convkp/conveng.pdf).

George C. Marshall (2005). Natural climate variability. (Disponível em: http://www.marshall.org/pdf/materials/340.pdf).

EEA – European Environmental Agency (2008). Impacts of European’s changing climate – 2008 indicator-based assessment. Joint EEA-JRC-WHO Report. EEA Report Nº 4/2008. ISSN 1725-9177. Copenhagen. (Disponível em: http://www.eea.europa.eu/publications/eea_report_2008_4/)

URL 1: http://www.grida.no



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