sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Aos cursos de … Presentes, Pretéritos e Futuros


Não há maior desventura
Do que termos de estudar!...
O tempo da formaturaÉ d’um imenso pensar!...
É fazer gastos insanos
É viver por cinco anos
Sem ser útil a ninguém
É sofrer mil dissabores
P’ra no fim sermos doutores
Se acaso ficamos bem!...
E assim p’ra não ficar mudo
P’ra dar lição regular
Hei-de sentar-me ao estudo
Logo que a cabra tocar.
E à noite, à banca de pinho
Sem dormir, hei-de sozinho
C’os calhamaços gemer
Dizer adeus ao cavaco,
À batota, à troça, ao taco
Da cábula ao gran prazer!
E se fosse isto somente
O que sofremos aqui!...
Assim não chega a mesada
A família está zangada
De fazer despesa tal!
Mas eu nada remedeio
Pois que em ‘stando o mês em meio
Já não tenho um só real!
Depois não tenho sossego
Se eu não possuo vintém.
Lá vão os livros p’ro prego
E vai o fato também
Maldito o dia primeiro
De todos que os meses têm:
Vem a servente, o padeiro,
Da tenda recados vem.
É dia de altas maçadas
Que enquanto cheira a mesadas
Saltam-nos todos os cães.
São mesmo como as harpias
Que nos vêm naqueles dias
Chupar todos os vinténs…
E como se fosse pouco
Tanto tormento aturar
Sai um homem como louco
Vai ao jardim passear
Cansado de aturar brutos
Nem se lembra dos estatutos
E as calças deixa cair;
Eis que um archeiro o apanha
E diz-lhe com muita manha
Que por força preso há-de ir.
Assim tudo se revolta
Contra o que quer ser doutor
Se p’rás pândegas se volta
Acha nelas dissabor.
Se, às vezes, por brincadeira
Toma a sua borracheira
Dão-lhe más informações.
Se vai à batota um dia
Volta c’o a bolsa vazia
Depois de ter mil ferrões.
Vai passear, rompe a capa.
As botas já rotas são.
Tem má frequência de banco
E leva um R por fim.
Lá vai o triste p’ra férias
Suas desgraças carpir.
Conta ao velhote mil lérias
Que ele não quer engolir.
Fala à mãe duma doença
Em que fez despesa imensa
Que ainda não pôde pagar…
Mas ela abana as orelhas
Que é, como todas as velhas,
Mui difícil de embaçar!
Assim, até mesmo a família
Vem o pobre arreliar
Volta cheio de quezília
Sua carreira acabar.
Volta aos trabalhos insanos
E assim vai passando os anos
Num contínuo dissabor
E no fim de tanto estudo
Está habilitado p’ra tudo
Porque chegou a Doutor!!!

L e J, “O Noticioso”,21/07/1864

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