sexta-feira, 4 de abril de 2008

Estatuto social, cívico e categoria profissional dos professores



Grande parte dos docentes das cadeiras instituídas pelo marquês de Pombal, que passaram, posteriormente, para os liceus tinha origem social na baixa e média burguesia. Muitos começaram por estudar nos seminários, mas por razões várias interromperam os estudos eclesiásticos e seguiram a instrução oficial. Somente alguns concluíram cursos universitários. Destes, o professorado surgiu como uma segunda ocupação e, quase sempre, a tempo parcial, sendo raros os que se entregaram à profissão com a dedicação devida. Daqui resultou um ensino rotineiro, sem inovação, mais passivo do que criativo. A carreira de professor no sector oficial das diversas disciplinas, equiparáveis ao actual ensino secundário, foi constituída por Passos Manuel por duas categorias: a de proprietários e a de temporários. Nesta última categoria havia, ainda, o caso particular dos interinos, nomeados, em regra, para suprir a ausência mais ou menos prolongada dos professores proprietários, que ocupavam cargos políticos e de carácter oficial, ou para os substituir devido às faltas motivadas por doença, ou ainda, por invalidez. No início do período liberal, pelo decreto de 15 de Novembro de 18361, o ensino secundário oficial, passou a ser regulado, ao nível dos distritos, por conselhos provinciais. Na Madeira, o conselho foi instalado a 23 de Fevereiro de 1837, por deliberação do Administrador Geral do Distrito, em conformidade com o art. 34.º do mencionado decreto. Nele tomaram posse os professores das aulas públicas de instrução secundária, instaladas no «Pátio dos Estudantes». De acordo com a lei, Manuel Joaquim Moniz, bacharel em Matemática, professor da cadeira de Geometria, assumiu a presidência, por ser o mais velho; Marceliano Ribeiro de Mendonça, professor da cadeira de Gramática Latina e Latinidade, ficou como secretário, por ser o mais novo; João de Freitas e Almeida, bacharel em Leis, professor da cadeira de Aritmética, inactiva à época; Sebastião Casimiro de Vasconcelos, cónego magistral e professor substituto da cadeira de Filosofia Racional e Moral; Pedro Nicolau de Freitas, bacharel em Leis, professor substituto de Lourenço José Moniz, na cadeira de Retórica e Poética; e, finalmente, Alexandre Luís da Cunha, professor da cadeira de Língua Inglesa e Francesa, ficaram como vogais. Esta comissão, no dia 12 de Junho de 1837, em reunião ordinária, deliberou constituir o Liceu Nacional do Funchal (LNF), transferindo-se estes professores das aulas secundárias, conforme o decreto de 17 de Novembro de 1836, para a nova instituição, passando a ser os primeiros docentes do Liceu e a reger as novas cadeiras2.Sobre a habilitação dos professores liceais, os decretos de 15 e de 17 de Novembro de 1836, determinaram que o provimento das cadeiras fosse sujeito a exame público, procedendo concurso de sessenta dias. O título seria de propriedade ou temporário, pelo período de dois anos, conforme o «grau de merecimento» que os candidatos mostrassem nos exames. A autoridade que dirigia as escolas seria responsável pelos provimentos temporários, postos a concurso cada dois anos. Os perpétuos seriam conferidos, em diploma, pelo Ministério do Reino (MR), sobre proposta graduada de todos os concorrentes. Em igualdade de circunstâncias, os professores temporários teriam prioridade sobre os restantes. Os candidatos a professor deviam ter vinte e um anos completos, comprovados por certidão de baptismo; possuir bom comportamento moral, político e religioso, certificado em documento autenticado pela Câmara, pelo Juiz de Paz ou pelo Administrador do Concelho, onde tivessem residido nos últimos três anos; apresentar certidão de folha corrida e um documento que comprovasse não padecerem de moléstia contagiosa, tudo reconhecido e selado. Costa Cabral, em 1844, instituiu as categorias de professores proprietários e de professores substitutos (que permaneceu até finais do século), podendo estes últimos passar à efectividade logo que abrisse uma vaga. Apesar de terem assento no conselho liceal, a sua situação era precária, pois tinham de desempenhar vários serviços entre os quais se destacam, a substituição no impedimento dos proprietários, independentemente das cadeiras que regessem e a participação nos júris de exames. No LNF não houve falta de professores. Se bem que os vencimentos fossem reduzidos, a relativa ausência de oportunidades no sector privado para a média burguesia funchalense fazia com que o magistério concorresse com outras carreiras públicas, em relação a muitas das quais se tinha algumas vantagens evidentes, assim como, prestígio social, baixo nível de habilitações exigidas e pouco tempo de trabalho efectivo. Além disso, a função docente era, quase sempre, uma segunda profissão, como já dissemos, menos extenuante que se exercia nas horas livres da primeira, constituindo o baixo salário um útil complemento às economias domésticas de quem também leccionava. Não podemos deixar de reconhecer que alguns professores do LNF, ao longo da época estudada, ocuparam igualmente os mais altos cargos públicos do Distrito, como presidentes da Câmara do Funchal, procuradores à Junta Geral, secretários-gerais do Governo Civil e mesmo de deputados da Nação.

Texto adaptado de Hélder César Spínola Teixeira «O Liceu Nacional do Funchal (1837-1900), Subsídios para a sua história» (Dissertação de Mestrado defendida na UMA no dia 25 de Setembro de 2006)

Sem comentários: